Texto O Eco de 12/10/2015
Quando o ajuste fiscal começou, no começo do ano, um assunto entrou na
pauta: a grande quantidade de beneficiários do seguro-defeso, o salário
mínimo pago aos pescadores artesanais para não pescar durante a época
reprodutiva dos peixes. O governo estava convencido de que havia fraude
em larga escala nesses benefícios.
Com o pretexto de passar a limpo o cadastro dos pescadores artesanais e
evitar fraude, o Ministério da Agricultura, que absorveu o Ministério da
Pesca após a extinção deste na última reforma ministerial, suspendeu o
período de proibição, o chamado defeso. O benefício do seguro não é pago
enquanto o pescador continuar trabalhando. Assim, o governo ganha tempo
para recadastrar os pescadores e deter as fraudes, sem precisar travar
uma briga com os sindicatos dos pescadores.
O Ministério da Agricultura alega, em nota que “assim, não há prejuízo
social para os pescadores e nem risco predatório para o meio ambiente”,
já que a publicação da portaria coincide com o fim do período de
proibição da pesca e da consequente liberação da atividade pelos
próximos oito meses. Entretanto, a própria portaria desmente a afirmação
do Ministério, com informações que são irreconciliáveis. Ela libera a
pesca por 120 dias (ou seja, até o dia 6 de fevereiro) e pode ser
prorrogada por mais 120 dias. Ao mesmo tempo, a portaria lista, por
exemplo, o período de defeso do curimatã (Prochilodus spp), piau
(Schizodon sp), sardinha (Triportheus angulatus) e branquinha
(Curimatidae) no Rio Grande Norte e Paraíba, que ocorre entre 10 de
dezembro e 28 de fevereiro, anualmente. Ou seja, a portaria libera a
pesca dentro do período de defeso de mais de uma espécie.
Assinada pelo Ministério da Agricultura em conjunto com o Ministério do
Meio Ambiente, a medida coloca em risco os próprios recursos pesqueiros.
O período de defeso garante o recomposição da população das espécies
pescadas. Outra medida protetiva é a moratória, quando a espécie está em
risco de extinção e se declara um período onde a pesca fica proibida.
Foi o que determinou a lista vermelha de peixes marinhos ameaçados de
extinção, a polêmica portaria 445, suspensa pela Justiça em junho, a
pedido do setor da pesca.
A norma estabeleceu proteção integral -- proibição total da pesca por
período indeterminado -- para 475 peixes ameaçados de extinção.
Originalmente, todas as espécies que constavam nesta lista não poderiam
ser pescadas quando a portaria entrasse em vigor. Mas ela ainda está
suspensa na Justiça e os peixes, cujos estoques estavam abaixo do
aceitável (e por isso foram postos na lista) poderão ser pescados mesmo
na época de reprodução.
Custos
O recadastramento dos beneficiários do Bolsa Pesca segue os dados de uma
auditoria feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que apontou o
desvio de 19 milhões de reais em pagamentos irregulares de seguro defeso
entre janeiro de 2012 e junho de 2013. Só em Brasília, sete mil
supostos pescadores recebem o salário-defeso, segundo o jornal O Globo.
Se o governo não sabe quantos pescadores, dentre 1 milhão cadastrados,
exercem a atividade de fato, menos sabe o que se pesca, onde e a
quantidade. O Brasil não produz estatística pesqueira desde 2008. O
cálculo da economia em não pagar o seguro-defeso já foi feito pelo
governo: pode chegar a 2,7 bilhões. As perdas de biodiversidade marinha e
de estoques pesqueiros só serão calculadas no futuro, e pode ser tarde
demais.
FONTE: Texto do O Eco, disponível também aqui.
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